Carta Infernal
Desquerido Lúcifer,
Estou em minha danação eterna há cerca de quinhentos e cinquenta e quatro anos e meio — segundo o tempo daqui — , e é engraçado que, a medida que o tempo passa, o tédio do Inferno aumenta exponencialmente. Não me levem a mal, meus caro demônio etéreo, cresci como um bom cristão como todos ao meu redor, e aceito minha pena por violar as leis divinas. Entretanto, gostaria de desabafar.
Semana passada, vosso amável Belzebu entrara em meu quarto de tortura sem aviso prévio e deixara uma caixinha com minha consciência tardia a fim de piorar minha impiedade. A questão é que desvivo há tantos séculos neste inferno que minha própria culpa não parece causar maiores efeitos quanto minha alma sofredora.
Peço perdão (ou seria “não peço”?) pela expressão, mas, Diabo, nem mesmo as chicotadas diárias de Asmodeus parecem me incomodar mais. De fato, quanto mais violência pareço sofrer, menos dor sinto. Posso receber três mil estacas amaldiçoadas no ânus, quinze golpes de maça em minha cabeça, dez decapitações consecutivas e nada sentirei. Tudo que sinto é tédio.
Gostaria que, portanto, por meio desta carta, absorvesse tais críticas construtivas a fim de aprimorar os calabouços que vós pecadores sereis enviados para angustiar eternamente pós nosso nada glorioso falecimento. Creio que possas começar esta tarefa removendo o cronograma de torturas. Explicar o que vai acontecer no dia, por exemplo: Segunda, chicoteamento; Terça, decapitação; e assim por diante; não parece um bom método de atacar a ansiedade dos que esperam seu sofrimento.
Bom ressaltar que escrevo isto enquanto recebo três mil estacas amaldiçoadas no ânus e, como pode ver, não me incomodo o suficiente com isso para parar minha escrita. Estou apenas expondo fatos a respeito da minha frustração com seus serviços.
Tudo de ruim,
Robert Roberts Robertson.